O termo pessoalidade nos remete principalmente a duas idéias fundamentais: àquela que diz do que existe de mais pessoal – próprio, particular – em nós e em cada pessoa com quem nos encontramos; e àquela que fala de um modo de relacionamento. Embora sejam distintas e, de fato, possam existir isoladamente, essas idéias – já não mais presas ao plano do pensamento, mas enquanto ato, enquanto aquilo que se vive em ato – se completam. Sozinhas, elas existem. Juntas, frutificam. Explicamo-nos.
Pessoalidade como o que nos é mais próprio, diz daquilo que nos distingue das outras pessoas, do que nos faz ser únicos no mundo, do que nos faz ser quem nós somos. Se levássemos este pensamento ao extremo, poderíamos chegar à conclusão de que estamos sozinhos no mundo, uma vez que nunca encontraremos alguém que compartilhe conosco o sabor único da nossa existência: a nossa pessoalidade.
Existe nos seres humanos, contudo, um aspecto muito interessante aqui: embora sejamos “únicos e irrepetíveis” [como diria Viktor Frankl], existe algo em nós que ultrapassa os aspectos que nos distinguem dos demais, existe algo na nossa pessoalidade – no nosso modo de ser e exercer quem somos – que compartilhamos com todos os seres humanos. E é este aspecto compartilhado que nos permite ter um relacionamento pessoal – um relacionamento que leve em consideração tanto o que nos é mais característico, mais particular, e que o outro também possui como propriedade pessoal, quanto aquilo que temos em comum e que nos permite dizer afinal: somos iguais.
Um relacionamento pessoal, então, é aquele em que podemos entrar em contato com as pessoas, compreender e respeitar suas idiossincrasias. E o que permite que isso aconteça está na possibilidade de que reconheçamos que, de algum modo, em algum aspecto, o outro é semelhante a nós. Somente na medida em que compreendemos que aquele com quem nos encontramos embora seja especialmente diferente ainda é nosso semelhante é que podemos ter um relacionamento pessoal e, somente então valorizar semelhanças e diferenças.
Interessante é observar que: distintas, essas compreensões a respeito da pessoalidade colocadas em ato se completam, se nutrem e se fortalecem mutuamente. Tal qual irmãs siamesas que compartilham órgãos vitais, “essas pessoalidades” necessitam uma da outra para, de fato, viver. Um relacionamento pessoal inexiste sem o respeito à pessoalidade, nossa e do outro. E só somos quem somos pois tivemos, em algum momento, relacionamentos pessoais que nos auxiliaram a reencontrar e a apostar naquelas características particulares de nós mesmos.
Neste sentido, um trabalho pode ser pessoal quando levamos em consideração todas essas coisas aqui já ditas. Ou ainda mais, quando colocamos em ato tais “pessoalidades” e transformamo-las em bens presentes e reais, praticamente palpáveis, na medida em que se tornam intrínsecos e inerentes ao nosso ser.
Um trabalho pode ser pessoal quando olhamos para o outro e vemos um ser humano – semelhante a nós – dotado de sonhos, desejos e planos permeados por suas particularidades.
Um trabalho pode ser pessoal quando olhamos e vemos uma pessoa, diferente em inúmeros aspectos, é verdade, mas semelhante a nós em um e fundamental ponto: somos pessoas. E este é o primeiro passo na estrada – de altos e baixos, forças e fraquezas – rumo à pessoalidade.