Atualmente, a população brasileira acima de 60 anos está aumentando. Esse é o resultado do aumento da expectativa de vida, que não é uma coisa que acontece apenas no Brasil, mas sim em todo mundo.
E em um mundo com mais pessoas idosas, a saúde é um tema muito importante, pois várias doenças estão associadas ao envelhecimento. E a preocupação com a “demência” também tem aumentado, e todo mundo fica se perguntando “pelo” Alzheimer.
Afina de contas, demência e “Alzheimer” são a mesma coisa? E a resposta é: não! Embora sejam coisas relacionadas, nem todo quadro demencial é um quadro de Doença de Alzheimer!
As pessoas confundem demência com a Doença de Alzheimer porque essa é a forma mais comum dentre os quadros demenciais. Mas existem outros tipos de demência e é muito importante saber disso.
Para entender direito, primeiro precisamos compreender o que é “demência”. Demência é a descrição genérica de um processo de perda da capacidade cognitiva que gera algum grau de prejuízo na vida da pessoa. Quando falamos em “capacidade cognitiva” estamos falando de algumas funções do cérebro que nos permitem executar tarefas no dia-a-dia, e elas são várias:
• A capacidade de recordar eventos, memorizar informações;
• O recurso de prestar atenção no que é importante;
• A capacidade de usar a linguagem de maneira correta, compreendendo o que é dito por outras pessoas e nos expressando de maneira adequada;
• A habilidade de analisar o contexto em estamos, fazer planos, organizar nossas ideias e nossas ações;
• A faculdade de controlar o nosso comportamento de acordo com cada situação, de agir de acordo com a regra social, ou seja, respeitar o ambiente, as pessoas presentes, saber se devemos ser mais ou menos formal;
• Nossa vivência afetiva harmônica com o nosso meio e com os eventos da nossa vida, o que, de modo genérico significa ficar triste diante de uma situação triste, ficar feliz em uma situação feliz, e por aí vai…
Essa lista não é exaustiva. Existem muitas funções que poderiam ser descritas. A ideia aqui, porém, é entender que cada uma dessas atividades se conecta com operações cerebrais e quando esse órgão adoece elas acabam sendo prejudicadas. Quando esse prejuízo é suficiente para causar impacto na vida da pessoa e vai piorando com o tempo, estamos diante de um quadro demencial. Portanto, falamos de demência diante desse tripé: (I) prejuízo cognitivo; (II) piora com o passar do tempo; e, (III) traz impacto na vida da pessoal, seja no âmbito pessoal, seja no contexto profissional.
Agora, uma vez que se tem evidência de um quadro demencial é preciso saber qual tipo de demência está ocorrendo, pois isso define o tipo de intervenção e os cuidados futuros que precisam ser tomados.
Na Doença de Alzheimer, por exemplo, sabemos que a função que costuma ser mais prejudicada é a memória, por isso devemos tomar cuidado para que falhas de memória não tragam danos ao paciente ou mesmo coloquem sua vida ou de outrem em perigo. Mas outras alterações podem acontecer, como dificuldade de se organizar, de se localizar no espaço [saber onde está], e em casos mais avançados pode haver algum grau de agressividade.
Mas, como dissemos, a Doença de Alzheimer é um tipo de demência, outras tantas podem existir. Se houvesse uma representação gráfica, seria assim:
Como os quadros de Doença de Alzheimer são muito frequentes, as pessoas pensam que demência e “Alzheimer” são equivalentes, mas não é bem assim.
Por exemplo, outro tipo de demência muito comum é a Demência Vascular, que acomete pessoas que tiveram algum tipo de doença cerebrovascular, como um acidente vascular encefálico [AVE, conhecido popularmente como “derrame”]. Após o AVE, alguns pacientes começam a ter perdas cognitivas, que não são revertidas com o tempo, pelo contrário, pioram e acabam trazendo impacto a sua vida. E temos aí, de novo, o tripé para falar em demência. Mas a causa aqui não é uma doença neurodegenerativa específica como a de Doença de Alzheimer, mas sim a Doença Cerebrovascular e, portanto, falamos em Demência Vascular. Nesse caso do AVE, os sintomas vão depender da área do cérebro que foi prejudicada. E as indicações terapêuticas vão depender do tipo de lesão e da necessidade do paciente
Vale dizer que o AVE pode trazer sequelas não-cognitivas. Um prejuízo motor como, por exemplo, a incapacidade de andar, é um tipo de sequela que pode acontecer, mas que não significa quadro demencial! Somente falamos em demência quando há prejuízo da capacidade cognitiva, ou seja, das funções do cérebro envolvidas no pensamento, na compreensão do mundo, na memória e por aí vai.
EM toda situação de suspeita de quadro demencial um médico deve ser consultado, preferencialmente um neurologista ou um geriatra. Eles devem explorar os sintomas e possíveis causas, e havendo necessidade, irão pedir os exames complementares, como exames clínicos de sangue, exames de imagem [tomografia ou ressonância magnética], e também a Avaliação Neuropsicológica [ANP]. A Avaliação Neuropsicológica é um exame diferenciado que tem por objetivo determinar se aquelas funções do cérebro estão preservadas ou não, e determinar avaliar o grau dessa alteração, se for o caso. Esse passo é fundamental para determinar se se trata de demência ou não.
Embora as demências ainda não tenham cura, fazer o diagnóstico correto é importante para se iniciar as terapêuticas disponíveis e melhorar a qualidade de vida do paciente e de seus familiares. Lembrando que diagnóstico é coisa séria, procure sempre alguém de confiança. 😉
NOTA: A última atualização do DSM-5 [Manual Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais] retirou o termo demência, adicionando uma nova terminologia: Transtorno Neurocognitivo Maior, ajudando a definir melhor a natureza de tais doenças e também retirando a carga negativa associada ao termo “demência”. Como o propósito desse post era discutir os termos numa linguagem mais próxima do público geral, optou-se por manter “demência” por ainda ser o mais usual.